Campinas (SP), 13 de janeiro de 2022.
A Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE) vem a público manifestar a total desaprovação ao Decreto Federal nº 10.935, de 12 de janeiro de 2022, dispositivo legal que revogou o Decreto Federal nº 99.556, de 1º de outubro de 1990, que dispõe sobre a proteção das cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional.
A SBE reforça que não foi convidada para contribuir ou para integrar grupos de discussão acerca desta modificação substancial da legislação espeleológica brasileira. O Decreto Federal nº 10.935/2022 foi produzido a portas fechadas, sem diálogo com a comunidade espeleológica e, claramente, mostra a interferência direta dos Ministérios de Estado de Minas e Energia e de Infraestrutura em uma matéria que é de interesse ambiental. Esta interferência visa à facilitação de licenciamento de obras e atividades potencialmente lesivas ao patrimônio espeleológico nacional e que, geralmente, estão associadas a atividades de alto impacto social.
Este novo decreto trouxe vários retrocessos à legislação espeleológica nacional, dentre eles:
– Permite que o órgão ambiental licenciador autorize a destruição total ou parcial de cavernas de máxima relevância por atividades ou empreendimentos considerados “de utilidade pública”, que não possuam alternativas técnicas e locacionais viáveis, que tenha viabilidade do cumprimento da medida compensatória e que os impactos negativos irreversíveis não gerem a extinção de espécie que conste na cavidade impactada (Inciso I, II, III e IV do Art. 4º);
– Excluí dos atributos que classificam uma cavidade subterrânea como de máxima relevância as condicionantes morfologia única, isolamento geográfico, interações ecológicas únicas, cavidade testemunho e hábitat essencial para preservação de populações geneticamente viáveis de espécies de troglóbios endêmicos ou relictos (§ 4º do Art. 2º);
– Possibilita que o empreendedor solicite a revisão, a qualquer tempo, da classificação do grau de relevância de cavidade natural subterrânea, independentemente do seu grau de relevância, tanto para nível superior quanto para nível inferior (§ 9º do Art. 2º);
– Possibilita que o empreendedor compense o impacto sobre uma cavidade subterrânea com a preservação de uma cavidade testemunho qualquer, sem ter o conhecimento sobre a real relevância desta caverna que está sendo preservada, pois o decreto atribui automaticamente máxima relevância, sem a exigência de estudos específicos (Art. 7º);
– Deixa aberta a possibilidade do Ministro de Estado de Minas e Energia e do Ministro de Estado de Infraestrutura realizar modificações em atributos ambientais similares da classificação de relevância e definir outras formas de compensação através de atos normativos (Art. 8º).
Assim, a Sociedade Brasileira de Espeleologia considera inconstitucional o Decreto Federal nº 10.935, de 12 de janeiro de 2022.
Reforçamos nosso total repúdio a este decreto e esperamos que o Governo Federal ouça a comunidade espeleológica, pesquisadores, pesquisadoras e as diversas instituições científicas que desenvolvem estudos nas cavernas brasileiras e que realmente podem contribuir para uma legislação espeleológica que, verdadeiramente, concilie o uso dos recursos que são essenciais para a nossa sociedade com a proteção deste patrimônio natural.
Atenciosamente,
José Roberto Cassimiro
Presidente da Sociedade Brasileira de Espeleologia
Atos formalizados contra o Decreto nº 10.935/22
Repercussões do Decreto nº 10.935/22
2ª Nota Pública da SBE (em 24/01/22)